segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Adeus

Adeus Je te bannis de ma mémoire,
Reste d'un amour insensé,
Mystérieuse et sombre histoire
Qui dormiras dans le passe!
Et toi qtíi, jadis, d'une amie
Portas la forme et le doux nom,
L'ínstant suprême oú je t'oublie,
Doit être celui du pardon.
A. DE MUSSENT.

ADEUS! P'ra sempre adeus! A voz dos ventos
Chama por mim batendo contra as fragas.
Eu vou partir... em breve o oceano
Vai lançar entre nós milhões de vagas ...

Recomeço de novo o meu caminho
Do lar deserto vou seguindo o trilho...
Já que nada me resta sobre a terra
Dar-lhe-ei meu cadáver... sou bom filho!...

Eu vim cantando a mocidade e os sonhos,
Eu vim sonhando a felicidade e a glória!
Ai! primavera que fugiu p'ra sempre,
Amor - escárnio!... lutulenta história!

Bem vês! Eu volto. Como vou tão rico...
Que risos n’alma! que lauréis na frente...
Tenho por c'roa a palidez da morte,
Fez-se um cadáver - o poeta ardente!

Adeus! P'ra sempre adeus! Quando alta noite,
Encostado à amurada do navio...
As vagas tristes... que nos viram juntos
Perguntarem por ti num beijo frio,
Eu lhes hei de contar a minha história.

Talvez me entenda este sofrer do inferno
O oceano! O oceano imenso e triste,
O gigante da dor! o Jó eterno!
Fazia um ano. Era o dia
Do fatal aniversário...

Ergui-me da cova escura,
Sacudi o meu sudário...
Em meio aos risos e à festa
E às gargalhadas da orquesta,
Que eu tinha esquecido, enfim,
Tomei lugar!... Solitário

Quis rever o meu Calvárío
Deserto, tredo, sem fim!...
Sabes o que é sepultar-se
Um ano inteiro na dor...
Esquecido, abandonado,
Sem crença, ambição e amor...

Ver cair dia... após dia,
Sem um riso d'alegria...
Sem nada... nada... Jesus!
Ver cair noite após noite,
Sem ninguém que nos acoite...

Ninguém, que nos tome a Cruz?!
Ai! não sabes! nunca o saibas!...
Pois bem; imagina-o só...
E então talvez compreendas
A lenda escura de Jó.

II

Mon coeur, encore plein d'elle, errait sur son visage
Et ne Ia trouvait plus.
MUSSET.
Porém de súbito acordou do ergástulo
O precito, que ali jazia há pouco...

E o pensamento habituado às trevas
Atirado na luz... - pássaro louco!
Vi de repente o passado
Erguer-se em face de mim...

A rir... a rir, como espectro,
De uma ironia sem fim.
A orquestra, as luzes, o teatro, as flores
Tu no meio da festa que fulgura
Tu! sempre a mesma! a mesma! Tu! meu Deus!
Não morri neste instante de loucura ...

Quebra-te pena maldita
Que não podes escrever
A horror de angústias e mágoas
Que então me viste sofrer.

A mesma fronte que amei outrora!
O mesmo riso que me vira um dia!
O mesmo olhar que me perdera a vida!
A mesma, a mesma, por quem eu morria!

Que saudades que eu tenho do passado,
Da nossa mocidade ardente e amante!
Meu Deus! Eu dera o resto de existência
Por um momento assim... por um instante.

Mas não! entre nós o abismo
Se estende negro e fatal...
- Jamais! - é palavra escrita
No céu, na terra, no val.
Eu - já não tenho mais vida!

Tu - já não tens mais amor!
Tu - só vives para os risos. 
Eu - só vivo para a dor.

Tu vais em busca da aurora!
Eu em busca do poente!
Queres o leito brilhante!
Eu peço a cova silente!

Não te iludas! O passado
P'ra sempre quebrado está!
Desce a corrente do rio...
E deixa-o sepulto lá!
Viste-me... E creste um momento
Qu'inda me tinhas amor!
Pobre amiga! Era lembrança,
Era saudade... era dor!
Obrigado! Mas na terra
Tudo entre nós se acabou!
Adeus! ... É o adeus extremo...

A hora extrema soou.
Quis te odiar, não pude. - Quis na terra
Encontrar outro amor. - Foi-me impossível.
Então bendisse a Deus que no meu peito
Pôs o germe cruel de um mal terrível.

Sinto que vou morrer! Posso, portanto,
A verdade dizer-te santa e nua,.
Não quero mais teu amor! Porém minh'alma
Aqui, além, mais longe, é sempre tua.

Castro Alves