Não é nenhum incômodo
explicar-lhe o que penso do infinito
o infinito é
simplesmente
um rude vento frio
que arrepia as mucosas
a pele
e as metáforas
e nos põe nos olhos
lágrimas de rotina
e na garganta um nó
de sortilégio
seguramente você já se deu conta
que no fundo não creio
que exista o infinito.
Bem sobre política
jesus
sobre política
meu bisavô que era liberal
espiava as criadas no banheiro
meu avô o reacionário
extraviava as chaves de suas dívidas
meu pai comunista
comprava hectares com um gesto de nojo
eu sou poeta
meu senhor
e você deve saber que os poetas
vivemos na virada desse mundo
claro que você talvez não tenha tempo
para ter paciência
mas deve saber que no fundo
eu não acredito na política.
Logicamente o estilo
o que penso do estilo
uma coisa espontânea que se vai fazendo só
sempre escrevi na cama
muito melhor que nos trens
que mais posso acrescentar
ah domino o sinônimo módico exíguo curto insuficiente
sempre escrevo pensando no futuro
mas o futuro
ficou sem magias esquecia que você
já sabe que no fundo
eu não acredito no estilo.
O amor o amor
ah caramba
o amor
de cara me agrada
a mulher
bom seria
a alma
o coração
sobretudo as pernas
poder levantar a mão
e encontrar a esquerda
tranquila ou intranquila
sorrindo desde o poço
da sua última preguiça
ou olhando olhando
como às vezes se olha
um pouco antes do beijo
depois de tudo
você e eu sabemos
que no fundo
o amor
o amor
é uma coisa séria.
Por favor
isto último
não vá publicar.
Mário Benedetti