sábado, 10 de setembro de 2022

O luxo de uma classe é contrabalançado pela indigência de outra

Mas como vive a minoria pobre? Talvez se descubra que, na mesma proporção em que alguns homens, nos aspectos externos, foram elevados acima do selvagem, outros foram degradados abaixo dele. O luxo de uma classe é contrabalançado pela indigência de outra. De um lado fica o palácio, do outro o asilo de mendigos e os “pobres silenciosos”. Os milhares que construíram as pirâmides para ser as tumbas dos Faraós recebiam alho para comer e talvez nem tenham recebido um enterro decente. O pedreiro que dá o acabamento na cornija do palácio volta à noite para uma choça talvez pior do que uma tenda. É um erro supor que, num país onde existem as habituais mostras de civilização, a condição de uma enorme parcela dos habitantes não possa ser tão degradada quanto a dos selvagens. Estou me referindo agora ao degradado pobre, não ao degradado rico. Para vê-lo, basta olhar os barracos que por toda parte margeiam as ferrovias, este último avanço da civilização; onde em minhas caminhadas diárias vejo seres humanos vivendo em pocilgas, e passando o inverno inteiro com uma porta aberta, por causa da luz, sem nenhuma pilha de lenha visível ou imaginável, e as silhuetas dos velhos e jovens permanentemente contraídas pelo longo hábito de se encolherem de frio e de fome, e o desenvolvimento interrompido de todos os seus membros e faculdades. Que bela visão olhar essa classe que foi quem fez, com seu trabalho, as obras que distinguem nossa geração. Em maior ou menor grau, é também a condição dos operários de todas as categorias na Inglaterra, que é o maior reformatório de trabalho forçado do mundo.

H D Thoreau.  Walden