“Decepção: desilusão. É a mesma coisa, e o gosto mesmo da verdade. O amor decepciona. A arte decepciona. A filosofia decepciona. Pelo menos decepcionam primeiro e por muito tempo – até o dia em que os amamos pelo que são, pelo que são realmente, pelo que são apesar de tudo, e já não pelo que se tinha sonhado ou esperado deles. Trabalho do luto: trabalho da desilusão. Não se trata de acreditar; trata-se de conhecer e amar. Um escritor que ainda acredita na literatura, que poderá ele ensinar-nos de importante sobre ela ou sobre a vida? E um filósofo, se acredita na filosofia? Um músico, se acredita na música? Um pintor, se acredita na pintura? E como amar verdadeiramente, enquanto se acredita no amor, enquanto se faz dele uma religião, um absoluto, um sonho? Toda esperança é decepcionada sempre, mesmo quando é satisfeita; é no que a satisfação tantas vezes é melosa, como um desejo insosso assim que é saciado… Muitos, constatando que a vida não corresponde às suas esperanças, vão então acusar a vida, censurá-la absurdamente por ser o que ela é (como ela seria outra coisa?), enfim enterrar-se vivos no rancor ou no ressentimento… Prefiro o alegre amargor do amor, do sofrimento, da desilusão, do combate, vitórias e derrotas, da resistência, da lucidez, da vida em ato e em verdade. Prefiro a realidade, e a dureza da realidade. Se a vida não corresponde às nossas esperanças, não é forçosamente a vida que está errada: pode ser que sejam nossas esperanças que nos enganam, desde o início (desde a nostalgia primeira que as alimenta), e que a vida só possa desde então nos desenganar… Gosto azedo da decepção, do qual nada cura senão o desespero, se for possível, a sapidez muito acre e muito salutar do desespero. Toda esperança é decepcionada, sempre; só existe felicidade inesperada.”
André Comte-Sponville em Bom Dia, Angústia
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