quarta-feira, 16 de agosto de 2017

As três transformações:camelo, leão e criança

No livro Assim falou Zaratustra, Nietzsche descreve o processo de transformação que ocorre no espírito humano em sua tentativa de se posicionar no mundo. Ele divide esse processo em três mutações: camelo, leão e criança.
A fase camelo do homem representa como nós somos levados culturalmente a pensar que temos um papel no mundo pré-determinado, devendo nos submeter a todas as regras impostas, sem reflexão. O que mais ouvimos é "fazes isso", "tem que ser assim", "deves obedecer".  Um exemplo disso é que " sustentamo-nos com bolotas e erva do conhecimento e padecemos fome na alma por causa da verdade" . Acabamos por achar que toda a carga cultural que nos é imposta é o parâmetro de nossa existência e continuamos nosso pesado caminhar pelo deserto.
Entretanto, alguns quando chegam nesse deserto e vivenciam a solidão de não ver sentido nessas ações rotineiras e desprovidas de real significado, se transformam em leão. E o espírito do leão aprende a dizer "não". Aprende que ele pode criar os seus próprios valores e romper com aqueles dominantes. Ele se volta contra seus antigos dominadores, seja a ideia de deus ou os princípios morais defendidos pela sociedade. Mas o leão tem força apenas para transgredir, não para criar algo e colocar no lugar daquilo que ele não quer aceitar. Para isso, o espírito leão deve se transformar em uma criança.
A criança apresenta as características da possibilidade de reconstrução do ser. Ela não tem medo do novo, não fica relembrando constantemente o passado e nem tão pouco coloca sua esperança no futuro. Pode assim criar e construir as bases de sua existência, já que ainda está aberta para a “eterna novidade do mundo” no dizer de Fernando Pessoa.
É esse espírito que possibilita uma existência significativa, que leva o ser humano a buscar fazer de sua vida uma obra arte, em conformidade com sua compreensão do mundo. Será sempre uma existẽncia provisória, sujeita a avaliações, redefinições e recomeços, o que pode gerar a sensação de angústia, característica da liberdade criativa. Mas, talvez,  somente assim conseguiremos chegar ao fim de nossa peregrinação terrena e cantar com Frank Sinatra,  “eu vivi do meu jeito”.

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