O homem que se dizia sorumbático acordou pensando na mulher. Acordou pensando ter sentido o seu cheiro inesquecível, de ter ouvido sua respiração ofegante e vislumbrando suas curvas sobre a cama onde estava.
Ao abrir os olhos, entendeu que o que sentia era um misto de saudades e de desejo. De desejo misturado a lembrança do prazer dos lábios da mulher, do seu toque, de sua risada gratuita e de tesão abundante.
O homem sorriu tentando rascunhar o que sentia em uma folha de papel. Sorriu porque percebeu que o que vinha à mente era um amontoado de clichês absorvidos ao longo de sua vida, como as frases das músicas que ele dizia nas horas de intimidade e prazer, que sempre faziam a mulher sorrir.
Mas o que o homem queria dizer, escrever, naquele momento, se tivesse a habilidade e a competência dos poetas que tanto lia, era que conhecer a mulher havia permitido a ele se aventurar em experiências da vida menos melancólicas, mais prazerosas, abençoado pelo deus Baco e por Eros.
Ao se levantar para o trabalho diário, sem conseguir concluir o que rascunhara, o homem abriu a janela e sorriu novamente, concluindo que não era necessário explicar, delimitar, conceituar o que sentia. Preferiu aceitar a contigência da existência e a sua capacidade de aproximar os improváveis.
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ResponderExcluirO homem que escreve me afeta. Talvez isso não tenha sentido - mas é o suficiente. Existe em mim (...) "quase uma ânsia de sentir o cheiro do corpo dele, dos braços, que às vezes adivinhei insensatamente."
ResponderExcluir( Guimarães Rosa, 1972)